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Herondina Rosa Thomáz da Silveira, a forma mais ímpar da resiliência

Rosi Oliveira / Especial DS 27/06/2023 Memória

Herondina Rosa Thomáz da Silveira, mais conhecida como Vó Dadá

Herondina Rosa Thomáz da Silveira

Herondina Rosa Thomáz da Silveira, a forma mais ímpar da resiliência

Uma mulher extremamente resiliente. Aquela que teve a capacidade de se adaptar em situações difíceis ou de fontes significativas de estresse, que, na maioria das vezes, tinha imensa dificuldade de dizer não e com os sofrimentos da vida, acabou por aceitar as coisas e acontecimentos como eram.

Essa era Herondina Rosa Thomáz da Silveira, mais conhecida como Vó Dadá, apelido que recebeu por conta do corpo e tamanho franzino que tinha, uma vez que media menos que 1 metro e meio e calçava número 33. Cresceu sendo assim carinhosamente chamada e o apelido a fez mais conhecida que seu nome de batismo.

A data de nascimento de Herondina é uma incógnita. No registro consta como sendo em 14 de janeiro de 1936, mas como antigamente era cultural registrar os filhos de uma vez só, a data é incerta para os filhos que relatam a história. Filha de Benedito e Maria (Lica), de quem Dadá herdou o tamanho, Herondina teve cinco irmãos (três mulheres e dois homens) dos quais era a mais nova das mulheres, ao nascer em Trajano de Moraes, no Rio de Janeiro, a ‘Cidade Maravilhosa’, que em nada reluzia para a família que era bastante humilde.

“Teve muito sofrimento e dificuldade”,

conta Rute Cardoso, uma das filhas. Trabalhavam na roça e tem uma história peculiar ocorrida na família. O pai da avó, por conta de um desentendimento, teve a morte decretada por Lampião do Cangaço e foi morto ao ser amarrado ao rabo do cavalo de Lampião, por quem foi arrastado. Para se sustentar e ajudar a família foi trabalhar de doméstica na Ilha do Governador ainda adolescente, e com 18 anos, recebe um convite para trabalhar em casa de família, como se dizia antigamente, para um diácono da igreja Batista, que foram os segundos pais da pequena Dadá, que mudou-se para o Paraná. Ali conhece o esposo na igreja, vindo de Juazeiro da Bahia e, depois de um breve namoro os dois se casam.

A mulher submissa: Um ato de amor pelos filhos

Do matrimônio, nasceram seis filhos, e a vida seguia feliz apesar das dificuldades, pois com o aumento da família, Herondina que morava na roça não podia mais ajudar o esposo na lida. Dias vão, dias vem e de repente, o esposo adoece e morre de forma rápida, deixando totalmente desamparada a família. Mas, como pressentia o que aconteceria, antes de partir, o esposo disse a ela que desse as crianças para os irmãos da igreja para que eles não passassem necessidade e ela não tivesse que sofrer tanto com a situação. Com apenas 25 anos e, como uma esposa totalmente submissa, ao ver que o esposo estava certo, fez o que ele dissera, embora o coração sangrasse, ficando com o menor dos filhos. Com a morte do esposo, se viu em uma situação extremamente difícil e teve que voltar a trabalhar para se sustentar e porque trazia no íntimo, a esperança que latejava em seu peito todos os dias e noites, de ter seus filhos reunidos novamente.

O novo recomeço entre os meus, os seus e os nossos

A viuvez durou cinco anos, quando na máquina em que trabalhava fazendo café, conheceu seu segundo esposo. Um viúvo que tinha sete filhos. E como diz o ditado popular, juntaram os meus, os seus e criaram os nossos. Dessa união, nasceram mais quatro, dentre eles, Rute que nos conta a história ao lado dos irmãos, Valdecir Gonçalves de Oliveira, Marcia Regina da Silveira Teixeira e Isaac Gonçalves de Oliveira.

“Ela amassava de cada vez cinco quilos de trigo para fazer quatorze pães, tudo no fogão à lenha”,

lembram os filhos.

Com o novo casamento, embora Herondina quisesse, somente dois dos filhos retornaram à sua companhia.

Aquela que tudo suportou pela fé aos pés da cruz

Com tantos filhos para sustentar, o esposo enfrentava qualquer tipo de trabalho, indo parar no Paraguai com toda a família. Os filhos relatam que as mudanças eram constantes porque não tinham uma moradia própria.  Associado a isso, o pai, que assim era chamado inclusive pelos filhos de Herondina, tinha o pavio extremamente curto, o que lhe valia os serviços que conseguia. Por isso, mudavam-se com constância, não parando ou construindo nada em lugar nenhum. Amanhecia empregado e de repente chegava em casa dizendo para a esposa arrumar as coisas porque tinham que partir do lugar.

“Minha mãe aceitava tudo caladinha. Nunca reclamava. O que ele fizesse estava feito”,

frisam.

Os filhos destacam que a força da mãe vinha da fé que mantinha sempre acesa como a chama de uma lamparina. Herondina não falava, não gritava, não questionava ou emburrava, mas corria aos pés de Deus aonde se debulhava em lágrimas pelos acontecimentos.

“Eu nunca vi minha mãe brigar com meu pai”,

relatam.

Para os filhos, apesar do temperamento forte, o pai sempre foi demasiadamente carinhoso com a esposa, com os seus filhos, e principalmente, com os filhos da esposa que o tem como o pai amado.

Tangará da Serra: A virada ao chegar na terra onde Dadá viveria para sempre

Com as diversas andanças e a lida no café, o esposo conheceu muita gente e muitos deles haviam mudado para o Mato Grosso e volta e meia, quando buscavam café no Paraná para revender em Tangará da Serra, incentivavam que se mudassem para a cidade. Com isso na cabeça e notícias de que em Tangará a terra era boa e a chance de vencer na vida era grande, deixou a família no Paraná assim que retornaram do Paraguai e veio conhecer o lugar. Gostou tanto que voltou com serviço arranjado somente para buscar a família. Herondina, como sempre não disse uma palavra sobre mais uma mudança.

Ao chegarem foram acolhidos pela família de Valdemar Pergo. Além do esposo, oito dos filhos vieram.

“Os menores vieram de ônibus e demoramos uma semana para chegar aqui. Já os maiores que vieram de caminhão e demoraram 15 dias”,

recordam sorrindo, ao frisarem que aqui chovia ao extremo.

“Subimos a pé essa serra. Chegamos no Progresso e tinha uma Rural (carro) que trouxe a gente até aqui. A gente subia e descia, escorregando. Passamos em cima de toras não tinha ponte”,

recordam aos risos.

Na cidade em desenvolvimento foram morar na Fazenda Palmeira, isso no ano de 1978. Ao chegarem na fazenda receberam uma casa que mais parecia um palácio para quem nunca havia tido nada.

“Era novinha”,

contam.

Aqui trabalharam na roça plantando e vendendo tudo que a terra dava.

Mas, como o esposo era de paciência curta, acabaram mudando para Rondonópolis, e ao retornarem novamente a Tangará, fixaram residência na cidade.

A homenagem 

Morando na zona urbana, Herondina vendia algumas coisinhas para passar o tempo, mas seu grande prazer era fazer os pães que sempre eram acompanhados de um café que só ela sabia como fazer para recepcionar as visitas. Na cidade moraram em alguns bairros, mas seus dias até sua partida no dia 11 de outubro de 2020 foi na rua 4 do Jardim Shangri-lá. A causa morte de Dadá foi dada como natural.

Por tamanha honradez, sabedoria e amor por Tangará, além de ter criado filhos e filhas que contribuíram e continuam a contribuir com o Município, seu nome foi dado a Rua 37 do Shangri-lá. A indicação foi feita pela vereadora Elaine Antunes.



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